segunda-feira, 20 de junho de 2011

Entrevista Gabriel o Pensador

São Bento do Sul

Como a mais aguardada atração da Feira do Livro deste ano, Gabriel o Pensador fez duas palestras na cidade quinta-feira. À tarde, conversou com 380 alunos da rede municipal na Sociedade Atiradores 23 de Setembro. Na ocasião, falou sobre os três livros lançados por ele.
À noite, no Ginástico, conversou com cerca de 500 professores onde falou sobre sua luta contra o racismo e contou trechos de sua vida, muitos deles descritos em crônicas e poesias no livro “Diário Noturno”. Para encerrar, ele cantou à capela a música “Cantão”, a qual abre o disco “Nádegas a declarar”. Logo após, concedeu entrevista para a equipe do blog Em Cartaz.

Em Cartaz – O livro “Um garoto chamado Rorbeto” fala sobre um menino que tinha seis dedos e depois acaba com a letra mais bonita da classe. No início da carreira você sofreu certo preconceito por ser um rapper branco e hoje é um dos artistas mais respeitados do Brasil. É meio autobiográfico o livro?
Gabriel o Pensador - O livro tem a ver com a descoberta da criança de si mesmo, se compreendendo, se aceitando, não apenas por diferença física, mas quem tem diferença no corpo ou no comportamento, mas a timidez natural de toda a criança. Isso sim, eu posso ter buscado na minha infância. A parte do rap, quando surgi na mídia, não senti muito essa coisa do preconceito. Foi questionado um rapper branco, mas não senti tanto isso na prática.

EC – No CD “Nádegas a declarar” você fez uma música onde fala sobre sua infância no Cantão e é a canção abre do disco. Naquela época você imaginava chegar onde você está hoje? Qual sua relação com esses amigos de infância? Mudou algo depois do sucesso?
GP - Não pensava nem em fazer música nessa época. Tinha feito algumas músicas até, de brincadeira, mas estava curtindo o lance do surf, do esporte, não imaginava muito isso. Mas depois dos 16, 17 anos eu comecei a fazer muita música e levando a sério, querendo gravar um disco e as coisas foram acontecendo. Hoje tenho uma relação de amizade com uma turma da antiga, como a gente fala, e tenho um carinho muito grande pelos garotos mais novos, o pessoal da nova geração. Um amigo meu até dá aula de surf, o Ricardo Bocão. Fora o surf, temos uma pequena ONG na Rocinha que ensina rap, break, DJ, toca discos e eu tenho um carinho pela comunidade que mora do lado da Rocinha, em São Conrado.

EC – Hoje você acha mais difícil compor e gravar um disco com uma gravadora ou lançar um livro por uma editora?
GP – Disco é mais trabalhoso, depende de outras pessoas. Às vezes você faz a música, quer mudar, quer melhorar. Esse meu último disco agora acabou a gravação, finalmente. Mas fizemos aos poucos, com muita coisa feita em São Paulo, é bem complicado gravar um disco e eu também, dependendo do processo eu é que complico mais. O livro depende do livro, o meu livro saiu “de uma tacada só”, um mês a produção, mas tem livros que os autores ficam anos também trabalhando e pode ser um processo até doloroso, então depende da obra. Você pode fazer um disco simples ou levar a vida inteira para gravar um.

EC – Em sua opinião, o apoio à cultura está um pouco desvirtuado hoje em dia com um Ministério da Cultura que cede R$ 1 milhão para Maria Bethânia montar um blog e tem uma dificuldade imensa e burocrática para liberar verbas menores a projetos de dança, teatro e música, de artistas desconhecidos?
GP – eu não acompanhei os detalhes dessa polemica da Maria Bethânia, mas pelo que entendi, ela não captou dinheiro público. A lei de incentivo teve aprovação para captar de empresas até R$ 1 milhão, um valor muito alto pelo que foi questionado. Pelo que entendi foi isso. Não vi grandes problemas, mas acho que tem uma fila, uma dificuldade e todo mundo querendo aprovar os projetos no esporte e na cultura, mas o mais difícil é captar. Pro artista mais desconhecido, bater na porta das empresas sempre é mais difícil. Vai da sensibilidade do pessoal do marketing apostar em novos talentos.

EC – Depois de “Tô feliz, matei o presidente”, censurada antes mesmo de você lançar o primeiro disco, você sofreu novas censuras sobre determinados raps mesmo que não tão visíveis e explícitas ou não?
GP – Não, censura não. Tenho uma música chamada “Pega ladrão” que eu gostaria que tocasse mais, na época. Daí entendi que tinha dificuldade para certos temas em rádio e TV. Ela fala de corrupção na política, mas censura não. Aquela censura de “Tô feliz, matei o presidente” é extra-oficial também porque não existe como ferramenta oficial e eles ameaçaram as rádios que tocassem a minha música. Naquela época o Collor ainda estava no poder e a música era criticando todas as denúncias que a imprensa já tinha feito de corrupção lá no final do governo.

EC – O que você costuma ouvir de música no carro e qual seu gosto pela leitura. Tem um estilo ou autor preferido?
GP – No carro até esqueço de trocar os CDs que ficam lá, então às vezes é bom ouvir rádio porque é mais eclético. Você coloca numa rádio que toca MPB, numa outra que toca hip hop, música eletrônica, vai variando. Leitura, na correria que estou hoje… voltei um pouco a curtir crônicas como Arnaldo Jabor, Veríssimo, coisas rápidas. Minha agenda está bem complicada, então estou lendo coisas curtas e voltando num hábito que tinha de quando estava na faculdade, lia Nelson Rodrigues. Não é o que estou lendo hoje, mas lia coisas curtas, eram uns contos, umas coisas assim porque dava tempo de ler no metrô, no ônibus e terminar a leitura. Até coisas antigas como Lima Barreto, mas não livros muito longos.

EC – É muito diferente fazer um show para 100 mil pessoas e palestrar para 380 crianças ou 500 professores, como você fez na Feira do Livro?
GP – Boa pergunta, porque não é muito diferente. Eu entro na conexão da comunicação do que eu tenho pra dizer. Tem diferença de emoção, nem sei como descrever. Mas na diferença do show e da palestra. Não vejo tanta diferença entre um show para 1 milhão ou para pouca gente. O mesmo vale pra palestra.

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